Muito obrigado, Senhor,
por existir o inferno.
Obrigado pela oportunidade que temos
de descansar em paz,
longe da indiferença carbonizada
dos tribunais.
Paus, punhos e lâminas
não conseguiram amolecer meu coração,
nem tornar mais dócil
a minha carne.
A Justiça me fatiou dia após dia.
A Justiça tem um rosto enrugado
de convicção.
A Justiça se alimenta de sangue e dor,
sem ter sido convidada
para o repasto.
Já perdoei meus algozes.
Dos algozes do mundo,
fui um do tipo padrão.
Mereço até ser chamado de Monstro.
Eu era um instrumento
da Casa dos Horrores,
mas dela já me libertei.
Colho agora tão-somente minha própria
iniquidade,
a montanha de crueldades
que ela me induziu a cometer.
Muito obrigado, Senhor,
pela oportunidade que tive
de deixar de ser um verme;
obrigado sobretudo por me permitir
que eu esteja ciente
da rastejante condição humana.

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