sábado, 10 de março de 2018

Um momento ridículo e sangrento da Humanidade*






Dá o pé, Loro,
conta mais uma vez aquela velha piada.
Amaciantes que deixam a roupa suave
como uma lixa,
relógios sempre atrasados
ou adiantados,
cometas Halley sem cauda,
eclipses totais mais ensolarados
que Cancun...

Teu beijo padrão Globo...
Teus dentes brancos e sensíveis...

Entre rádios populares que só tocam sertanejo
e rádios universitárias que só tocam avant-garde
não sei o que fazer...
Entre jornais que mostram apenas o que todos já sabem
e escrituras sagradas que são uma caótica e irregular
coletânea de mitologia hebraica
não sei o que fazer...
Entre espaçonaves e guerrilhas
e Caetano Veloso em fotomontagens absurdas
só sei que vou deixar de perguntar o que fazer
e respirar um pouco.

Não, não posso orientar ninguém.
Posso apenas dar e receber carinho.
Reintegrar-me em situações.
Mas... onde te enfiaste agora?

Eu faltei no trabalho para estudar;
perdeste a prova por causa do serão.
Já ouvi essa história antes,
sei o fim do filme
mas não quero me conformar.
Precisamos conversar,
precisamos transar,
mas esta noite São Pedro
teve outros planos.

Antes tivéssemos um...

Desliga a TV,
não contribuas com a ignorância.
Não nos encontramos;
um muro imenso nos separa:
chamemos Roger Waters e aprendamos a viver...
ou a destruir uma banda numa crise de ego
para a separação definitiva;

meu Deus!
Dá o pé, Loro,
conta aquela velha piada mais uma vez.
Grandes glúteos padrão SBT,
um cantor canastrão cantando para ti.
E os dias especiais...

Nunca nos encontramos,
eu não te encontro em tua casa
ou na tua escola,
nem com tua prima esquálida
ou tua tia gorda,
nem dentro do meu coração
numa hora dessas...

Agora é apenas um único amor,
na voz de um roqueiro irlandês católico
de fé vacilante.
Apenas um único amor,
no fundamentalismo islâmico
ou cristão.
Atire a primeira pedra
quem estiver sem,
mas sei que os meus pecados não ferem alguém,
como faz a tua fé
– sim, isto é contigo!

Mas quem tu és, afinal?
Nada muito especial.
E não leves tão a sério meus massacres.

Dá o pé, Loro,
conta pra mim o final do livro.
Fala mais alto
outra piada que fale da gente.
Só o ódio constrói,
só o ódio TE constrói.
As luas novas que não vejo,
as luas cheias encobertas,
as luas azuis às quais ninguém mais dá atenção;
ah! faz-me crer,
faz-me rir
a todo custo.

Loro, Loro Curupaco, me diz
por que é sempre assim.
Tentando entender,
me despedaço em multidões...
Ainda, ainda hoje e sempre,
caímos dominós dominados,
a criança admira
o suor no uniforme dos soldados
e uma estátua santificada vem nos abençoar.

Por que é sempre assim?









* Escrevi este poema em 1995, me referindo vagamente ao episódio insólito ocorrido no dia 12 de outubro daquele ano (Dia de N. Sa. Aparecida): o pastor Von Helde (depois promovido a bispo), da Igreja Universal do Reino de Deus, injuriando uma imagem de Nossa Senhora em programa de TV.

A princípio, tentei não colocar minha opinião – apenas escrever por livre-associação e ver no que daria...








Nenhum comentário:

Postar um comentário